Papo de Box: Ele era um Campeão, mas abandonou as corridas, por Oscar Sajovic

Oscar Sajovic conta mais uma de suas histórias, agora sobre um fato no apaixonante e antigo circuito de Interlagos, com todas suas romanticas curvas.


Era a primeira corrida dele como PC, Piloto de Competição.
Ele havia barbarizado na “Estreantes/Novatos”, categoria de acesso ao Automobilismo. FazÁ­amos, uma corrida como Estreante, e mais cinco como Novato para depois recebermos a carteira de PC. CorrÁ­amos com nossos próprios carros om todo equipamento de segurança exigido pela CBA instalado neles.

Bruno Brunetti e Skortzaru, Comissários Técnicos da CBA e da Fasp eram implacáveis, nas vistorias da Federação Paulista de Automobilismo, se não estivesse no regulamento, não entrava na pista.

José Ricardo Ozores Vallejo era protegido de Marivaldo Fernandes. Diziam, que seu Pai, mMédico, professor da Faculdade de Medicina de Santos, havia salvo Marivaldo, em uma operação de abdÁ´men. A situação se complicara na mesa de operação e Dr. Victor Rodriguez Vallejo, conseguira contornar o problema, Expedito Marazzi havia me avisado que Vallejo iria passar por cima de mim. Eu que me cuidasse, ele não brincava em serviço.

Eu já corria desde o inÁ­cio de 1976 como PC. Mingo, Domenico Procce, era quem acertava o motor de meu carro.
Uma BrasÁ­lia do ano, que papai havia comprado para que eu o ajudasse Á  administrar a Fazenda, em suas viagens.

Mas, com 40 CV a menos que os Dodge Polara e um pouco menos que isso, em relação aos Passat 1500 ele tinha uma mão incrÁ­vel p/ carburar, e sabia segredos como ninguém, para acertar um distribuidor. Era um talento nato, além de muito honrado e honesto. Eu nunca tive salário para ajudar papai, e nunca me preocupei com isso. Aprendi em casa que a gente trabalhava por um amanhã melhor, e sacrifÁ­cios, era o preço que tÁ­nhamos que pagar por isso.

Papai não me queria nas corridas, não queria nem conversa sobre isso, embora quando estudasse interno no Liceu Nacional Rio Branco ele fosse fã do seu Chico Landi.

Nos domingos de folga ele e tio Oscar iam passear no Higienópolis, passando em frente Á  casa do famoso Piloto para ver seus carros se a porta da garagem estivesse aberta. Papai me contou isso muitos anos mais tarde.

Eu sempre andava sem dinheiro e Mingo muitas vezes me pagou o lanche em Interlagos. Vallejo  tinha o carro acertado pela Motorquim, de Santos.

Seus motores eram montados na Volkswagem assim corria o comentário. Ele era aluno da Fei, Engenharia AutomobilÁ­stica, e entendia muito de acertos. Eu havia trancado a matrÁ­cula da Faculdade, Engenharia Mecânica, em Bauru para poder me dedicar somente Á s corridas e ao trabalho, na Fazenda.

Até falei para papai que iria prestar vestibular para agronomia, que iria fazer cursinho, de qualquer maneira não estava indo a lugar algum, na escola, me assustara com tanta matemática.

No primeiro treino, com chuva Vallejo enfiara seu Fuscão 1600 S em 8º, no meio dos Polara e Passat 1500. Eu ficara em 11º. Depois dos treinos Marazzi passou pelos boxes e me falou novamente: “Não lhe avisei?”.

No segundo treino, no sábado, no seco caÁ­mos mais para trás, mas ainda estávamos enfiados entre os Passat 1500 e Polaras. Áttila Sipos, assistindo uma corrida de Vallejo, ainda como novato observara que seu carro subia muito forte da curva 4 para a ferradura e lhe falara que o motor estava fora, Vallejo me contou isso, esses dias.

Eu tbém não sabia como seu carro andava forte no miolo, mas eu tinha certeza que fora do regulamento não estava. Literalmente, eu escorregava na baba para acompanhá-lo no miolo, mas as coisas se invertiam nas curvas de alta.

A 1, 2, Lago, Sol e Laranjinha eu fazia flat, de pé trancado no chão, sem aliviar. Vallejo dava uma levantada de pé na 1, e eu caprichava na Junção, para subir em seu vácuo. Se perdesse, sobrava na Ferradura e eu não abria para tangenciar, e freava depois do salto quando  o carro apoiava no chão, eu esterçava Á  esquerda e freava ao mesmo tempo, provocando uma deliciosa derrapagem controlada, esterçando Á  direita e dosando o pé direito para controla-la até subir na zebra para então encher o pé no acelerador.

AÁ­, com certeza ele não levava vantagem, nem na freada do Sargento. Eu utilizava amortecedores bem mais duros montados pelo Velho Guággio, meu amigo, lá de Bauru, e podia frear mais tarde em quase todas as curvas. Mas nas curvas de baixa não havia o que fazer, e sobrava já na saÁ­da do Sargento, no S,  Pinheirinho, Bico de Pato e Junção.

Nas tomadas de tempo eu fiquei 4 posições atrás de Vallejo e ouvi novamente Marazzi dizer: “Eu lhe avisei”.

Caprichei na largada, levei um Polara que estava ao meu lado mas Vallejo também largou bem. Procurei não desgrudar dele. Desci no vácuo de um Passat até a chegada da 3, tirei do vácuo, quando ele freou emparelhei e o ultrapassei.

Peguei o vácuo de Vallejo na saÁ­da da 4, subindo para a Ferradura. Andávamos no bolo, vários carros, muito próximos. Se ele fosse tangenciar para entrar nela, iria ser ali mesmo que o iria ultrapassar.

E não conseguia parar de pensar em Marazzi, ele me ajudara muito, para que eu conseguisse a carteira de piloto, e fora amigo de uma tia minha, na década de 50. Quando fiquei sabendo disso pedi-lhe que me apresentasse Á  ele. Quando eu lhe disse que não tinha dinheiro para pagar pela Escola de Pilotagem ele me falara que eu poderia pagar como pudesse.

Chegando na Ferradura Vallejo abriu para tangenciar. Foi macuco no embornal, ultrapassei-o, ali mesmo. Sai bem torto mas mantive a posição descendo para o lago. Pensei que já tinha o que falar para Expedito Marazzi.

Acho que até, deveria estar sorrindo dentro do capacete. Imaginei como Vallejo deveria estar furioso pela ultrapassagem.

Após o Lago, subindo para o Sol Vallejo encostou muito, não bloquiei, não costumávamos fazer isso. Mas Ele não tentou a ultrapassagem, descendo para o Sargento, abri um pouco, mas na saÁ­da do Sargento, subindo para o Laranjinha ele me ultrapassou muito facilmente, e abriu muito.

Em todas as curvas seguintes, no S, Pinheirinho, Bico de Pato e Junção caprichei na Junção, freei um pouco antes para sair mais forte, e mesmo andando em seu vácuo não consegui me aproximar muito. Mas após a 1 meu carro crescia muito, voltei a encostar nele e fizemos a volta colados um no outro. Consegui me manter colado nele na Junção e subi em seu vácuo.

Depois da subida do Café tentei tirar de seu vácuo, mas sobrei. Voltei para seu vácuo, ele refrescava o pé do acelerador na 1 e eu vinha flat. Entre a 1 e 2, ele veio para dentro fazendo um traçado defensivo. Enfiei o carro por fora e o ultrapassei.

Até hoje ele não se conforma com essa ultrapassagem, “Justo na curva que Eu mais gostava”, diz. Nos alternamos várias vezes, de posição sempre de uma maneira muito limpa. Ele na verdade era um Cavalheiro, na pista.

Até que em uma delas eu tentei acompanha-Lo, no S e quase perdi o controle do carro. Derrapei demais. Ainda tenho uma foto da Braza com uma das rodas dianteiras erguida mais de um palmo do chão.

Consegui recobrar o controle com muito trabalho, mas perdi muito tempo e Vallejo abriu. Dessa disputa saiu uma foto na Auto Esporte, dizendo que os Fuscas 1600 refrigerados a ar, haviam conseguido acompanhar os Polaras e Passat 1500, mais lentos.

Mas a verdade é que andamos na frente de uma porção deles. Escreveram ainda que: ”Oscar Sajovic, em uma bela disputa com Ricardo Vallejo quase perde o controle do carro no S”.

Vallejo parou na sexta volta, eu parei no box para recolocar o cabo de uma vela que tinha escapado e perdi várias posições. Meu carro perdia no miolo porque o Quim, da Motorquim colocou o diferencial mais curto do Fusca 1300 no 1600 S de Vallejo, me contou tempos depois. Mas Ele, tinha um carro muito acertado.

Bruno Bruneti, havia feito acerto das suspensões, em sua oficina. Até me contou todos os macetes. Luis André Ferreira, da Condor, venceu a corrida. Francisco Artigas da Sopave SDR, chegou em segundo. RÁ´mulo Gama, da DallÁnese/ H filtros em terceiro depois que Áttila Sipos quebrou o motor ao meio e não terminou a prova. Todos Eles correndo com Passat.

Naquele ano Attila Sipos foi o Campeão Paulista e Fábio Sotto Maior o Campeão Brasileiro correndo com Dodge Polara 1800. Vallejo, no ano seguinte foi convidado por Herculano Ferreirinha, da Heve a correr em um de seus Fórmula V 1300 sem pagar nada, mas ele sofreu um acidente muito forte treinando, descendo para curva do Sargento ficou sem freios e bateu. Não se machucou muito mas nunca mais quis entrar em um carro de corrida.

Continua meu amigo até hoje embora já esteja meio velho e ranzinza. Foi um dos melhores Pilotos que conheci.
 
Participaram dessa corrida:  Francisco Artigas, Luis André Ferreira, Luis Otávio Paternostro, RÁ´mulo Gama, Water Watacabe, Fausto Wajchemberg, Vicente MaurÁ­cio Correia, Luis Bernardo Losso, Edmundo Francisco Delta, Luis Carlos Rios, Ricardo Urquini, Reinaldo Baena, José Carlos Otonari, José Arato, Rubens Salgado, Áttila Sipos, Fábio Sotto Maior, Vallejo e Eu.
 
Na Classe C, venceu  Edgard Mello Filho, em 2º Jaime Silva e
3º Affonso Giafone.

Também participaram: Carlos Amaral, Humberto Roperto, Renee Denigres, Ozório Araújo, Willian Tadeu Nogueira, Dimas de Mello Pimenta, José Molinari, Mauro Saraiva, Aloysio Andrade Filho, Carlinhos Cardoso Lima, Ernesto Alves Santos, José Luis Versa, José Oswaldo Bastos, Expedito Marazzi, Carlos de Carvalho Crespo, Reinaldo Campello de Luca, Marinhjo Amaral, Fabio Crespi, Mario Silva Rodrigues, Camilo Cristófaro Jr.”
 
Escrevi esse artigo na Fazenda.
Apoiado na carroceria da Pick up.
Enquanto acompanhava o plantio de cana de açúcar.
E senti saudade do traçado original de Interlagos.
Que ainda pode ser recuperado.
 
Fiquem com Deus e rezem o Terço