WEC: Bruno Senna ensina tudo sobre o Mundial de Endurance

Piloto da Aston Martin revela detalhes da categoria que corre em Interlagos no fim de semana

Depois de três temporadas incompletas na Fórmula 1, Bruno Senna se transformou rapidamente em atração do Campeonato Mundial de Endurance graças Á  vitória em Silverstone e ao segundo lugar em Spa na classe GTE Pro logo nas primeiras etapas de 2014. Neste fim de semana, o calendário será movimentado com a Le Mans 6 Horas de São Paulo, e as atividades de pistas em Interlagos serão abertas na sexta-feira com a realização de duas sessões de treinos livres. Depois do abandono nas 24 Horas de Le Mans, provocado por acidente envolvendo o companheiro Fred Makowiecki, Bruno buscará a reação em parceria com o britânico Rob Bell no Vantage 99 da equipe de fábrica da Aston Martin.

Bruno chega ao Brasil no inÁ­cio desta semana, ansioso pelo reencontro com o público brasileiro. Consciente de que não apenas os torcedores, mas também a imprensa, não estão familiarizados com as corridas de resistência, Bruno produziu uma espécie de manual. “Percebi que muita gente não conhece o Endurance no Brasil. Como a Fórmula 1 é a categoria mais popular por aqui, preparei este guia para sanar as dúvidas básicas e algumas mais avançadas para quem quiser saber um pouco além do trivial”, explicou.

CaracterÁ­sticas básicas do Endurance:

Diferentes categorias andando na mesma corrida:

1) GTE

Esta é a categoria em que estou competindo neste ano.

GTE-PRO – Permitida a participação de apenas pilotos profissionais na PRO. São os carros que mais se assemelham aos modelos de rua. Muitos fabricantes participam com seus carros pela alta visibilidade que a categoria oferece, a exemplo da Aston Martin, Ferrari, Porsche, Lamborghini, Corvette, Viper e BMW.

Na GTE-PRO, o desenvolvimento dos carros durante a temporada está liberado, inclusive em relação a motores, chassis e pneus. A categoria é extremamente competitiva e os carros são muito confiáveis. Por isso, as corridas são disputadas sempre no limite e não raramente terminam com poucos segundos de diferença entre os competidores, mesmo ao final de uma maratona de 24 horas.

GTE-AM – Permitida somente a presença de um piloto profissional ao lado de outros pilotos amadores ou semi-profissionais por carro. Geralmente são utilizadas versões do ano anterior e as especificações técnicas são rÁ­gidas, sem potencial de desenvolvimento.

Os números do GTE-PRO são brancos em caixa verde.

Os números do GTE-AM são brancos em caixa laranja.

2 – LMP1

É a categoria destinada mais a fabricantes e fornecedores de chassis e motores. Em uma pista normal, um protótipo da LMP1 tem um tempo de volta cerca de 10-15 segundos mais lento que um F1. SofisticadÁ­ssima tecnologia empregada nesses carros, como motores a gasolina, turbo, diesel, hÁ­bridos, muita eletrÁ´nica embarcada e altÁ­ssima velocidade final, acima dos 340 km/h.

As principais equipes da LMP1 são Audi, Toyota e Rebellion.

Os números dos carros são brancos com caixa vermelha.

3 – LMP2

São versões mais básicas do LMP1, com menor potência nos motores e menos aderência aerodinâmica. A LMP2 é voltada a equipes independentes de fabricantes. É fácil confundir um LMP2 com o LMP1 na pista sem conhecer as distinções entre equipes. Os carros de LMP2 são em média 5-7 segundos mais lentos por volta que os melhores LMP1. Em termos de pico de velocidade, o LMP2 é bastante parecido com o GTE, o que dificulta a ultrapassagem em retas.

Na LMP2 é mais comum a presença de pilotos semi-profissionais, o que nem sempre permite que esses carros atinjam o potencial máximo nas corridas.

As principais equipes do LMP2 são HPD (na American Le Mans Series) e Lotus.

Os números do LMP2 são brancos em caixa azul.

Nivelamento de performance dentro das categorias:

Dentro do Endurance, como o regulamento permite o desenvolvimento do carro com muito menos restrições do que na F1, por exemplo, são elevadas as chances de equipes com mais recursos financeiros e técnicos apresentarem performances que as outras não conseguem alcançar. Por isso, a categoria ativamente tenta “nivelar” a performance dos competidores por meio dos seguintes recursos:

Aumento ou diminuição do peso dos carros
Aumento ou diminuição das asas traseiras
Aumento ou diminuição dos restritores de ar nos motores
Aumento ou diminuição do tamanho dos tanques de combustÁ­vel

Corridas de longa duração:

1- No World Endurance Championship (WEC) as corridas são de 1.000 km ou seis horas de duração.

2- Corridas como a Sebring 12h, justificando a denominação, têm 12 horas de duração.

3- As principais provas do Endurance (Le Mans e Nurburgring) duram 24 horas.

Troca de pilotos no mesmo carro durante a corrida:

1- No WEC (World Endurance Championship), geralmente cada carro tem dois pilotos, mas três também é comum.

2- Em corridas com 12 horas ou mais de duração, o habitual são três ou quatro pilotos por carro

3- Pelo regulamento, um piloto não pode pilotar mais de quatro horas em cada perÁ­odo de seis.

Preparação e rotina de pilotos e equipe

A parte mais desafiadora das corridas de longa duração, com certeza, está relacionada ao desgaste humano. Antigamente as máquinas eram frágeis, e para terminar a corrida era sempre necessário segurar o ritmo, evitando falhas mecânicas ou incidentes.

Hoje em dia, com o grande desenvolvimento tecnológico experimentado pelo automobilismo, a máquina não é mais o fator limitador de performance das corridas. Por isso, tanto os pilotos quanto as equipes têm de estar muito mais preparados para um ritmo mais forte e maior agilidade, porque as margens entre os carros e equipes estão muito mais próximas.

Pilotos de protótipos LMP1 e LMP2 estão sujeitos a longos perÁ­odos de forca-G acima de três vezes a da gravidade em freadas e curvas. Então, necessitam de uma preparação fÁ­sica muito boa. Pilotos da GT sofrem muito mais com altas temperaturas dentro dos carros, cujas janelas estão sempre fechadas e oferecem pouca refrigeração para não perder performance. Durante as corridas, as equipes sempre tentam fazer com que os pilotos fiquem pelo menos duas horas no carro a cada turno. Assim, os outros pilotos do time podem descansar, se alimentar e hidratar para a próxima “tocada”. Quando o piloto dorme entre os seus turnos, é importante ser acordado com tempo suficiente para estar alerta e pronto para voltar a dirigir. Cabe ao fisioterapeuta a tarefa de cuidar dos perÁ­odos de descanso e alimentação.

Fatores imponderáveis, como a entrada do safety car ou a mudança do clima, permitem mudanças estratégicas pelo lado da equipe. Isso geralmente altera a duração dos turnos e pode colocar mais carga em um piloto ou tirar descanso de outro. O carro vai equipado com um recipiente contendo água ou drink esportivo com eletrólitos para recompor a hidratação do piloto durante os turnos.

Pelo lado da equipe, mecânicos e engenheiros também sofrem bastante com a longa duração da prova. Engenheiros não podem perder a concentração em momento algum e devem estar atentos a todos os detalhes da telemetria do carro, que lhes fornece importantes informações sobre a “saúde” dos componentes. Qualquer descuido nesse sentido pode resultar em acidentes provocados por falhas mecânicas ou abandonos prematuros por quebras que poderiam ter sido previstas e evitadas com a troca das peças envolvidas.

Alem de permanecerem sempre ligados nas informações que vem dos próprios carros, os engenheiros precisam monitorar o que ocorre com as outras equipes, as condições climáticas e da pista, como bandeiras amarelas, óleo, safety cars, etc. Essas variáveis externas ao carro são fatores determinantes na estratégia de corrida e, numa categoria tão competitiva como a GTE, podem tranquilamente decidir uma vitoria ou uma derrota.

Os mecânicos são certamente os que mais sofrem durante uma corrida de endurance. Normalmente já vêm de longas horas de trabalho durante as semanas que antecedem Á  prova. Toda a preparação do carro nos dias e noites anteriores, pós-classificação e pós-warm-up são essenciais para a performance na corrida. Ao longo da competição, os mecânicos são acionados no mÁ­nimo de hora em hora para os trabalhos de pit stop.

Além disso, durante a prova são relativamente comuns as paradas na garagem para reparos de carroceria, troca de freios e outros desgastes que exigem a intervenção da equipe. Isso faz com que a fadiga seja um fator por vezes determinante no trabalho dos mecânicos.

A equipe dispõe de fisioterapeutas com a missão de manter todos alimentados, hidratados e descansados durante a corrida. Ademais dessas funções, esses profissionais estão sempre ocupados com lesões e machucados que possam vitimar os integrantes da equipe.

As áreas de descanso para os pilotos e equipe são bangalÁ´s ou motorhomes com camas e sofás fora do espaço do paddock. Por causa da grande quantidade de carros na pista e do barulho constante, não é fácil descansar com toda a adrenalina no sangue. Pilotos mais experientes conseguem repousar melhor e sabem como administrar seus ritmos para não se estressarem demais durante a corrida. Isso os ajuda a chegarem com menor fadiga nos momentos finais e decisivos das corridas.